A Drª Fátima, como agora é moda as pessoas que vão ao Programa tratarem a apresentadora, não tem culpa nenhuma. Ela bem tenta que tudo corra na melhor das harmonias, fazendo apelos constantes para que as claques convidadas não batam palmas aos seus “palestradores” (frase de um convidado do ‘Não’ do programa de ontem), ameaçando retirar a palavra a quem fala se a claque se manifestar, apelando ao são debate de ideias, calando-se perante os convidados e deixando-os falar sem os interromper, ao contrário de Maria Elisa Domingues que quer sempre ser figura de proa,…enfim, tudo fazendo para que a emissão seja esclarecedora dos temas em debate.
Daqui resulta que o fiasco de um programa como o de ontem não possa ser assacado à Drª Fátima.
Era a última oportunidade, em emissão de grande audiência, para que as pessoas pudessem ser esclarecidas das razões dos partidários do ‘Sim’ e do ‘Não’ à pergunta que irão ler mais uma vez nos boletins de voto, já no próximo Domingo.
Médicos e advogados, de um e de outro lado, falaram e falaram sobre o aborto, o embrião, o feto, o filho, a mãe, os direitos de um e de outro, se a vida é vida e quando o é ou não é, da dor que o feto sofre ou não sofre, do coração que bate a 170/175 pulsações/minuto já antes das 10 semanas, de despenalização, liberalização, criminalização, descriminalização, do Sim á vida e do Não à morte.
Chegados ao fim, parece que todos concordam numa coisa: na necessidade de diminuir o aborto clandestino. E nesse ponto concordarão decerto todos aqueles que irão votar.
Os ‘Sim’ e os ‘Não’ querem então o mesmo?, ter-se-ão perguntado os heróicos resistentes ao sono, às 2:00 da madrugada.
E a confusão dos indecisos, dos que mais precisam de ouvir quem os esclareça, terá aumentado.
Sou, desde sempre, contrário à criminalização da mulher pela prática do acto em questão. Sempre o disse, sempre o escrevi. Sem introduzir novas nuances, sem procurar ganhar terreno em função da opinião que se vai antevendo venha a ser a dos votantes no referendo.
Os partidários da opinião contrária, introduziram na última semana uma espécie de adenda ao seu voto: votamos ‘não’ porque não queremos o aborto livre e sem condições, mas também não concordamos com a penalização da mulher por crime. E já preparam projectos e mais projectos que vão trazendo à opinião pública, tentando confundi-la e, assim, ganhar alguns votos.
É um autêntico 2 em 1! É o NIM! Desvirtua-se a pergunta aprovada por todos em lugar próprio, acusa-se a pergunta de não contemplar um projecto que dê certezas quanto ao que se fará depois da votação, como se tal fosse possível. Meus senhores: A Constituição portuguesa não permite referendos a projectos de lei! E os senhores sabem-no bem!
A pergunta é, mais uma vez o afirmo, extremamente clara.
Votar SIM é obrigar o legislador, pelo voto popular, a retirar do Código Penal a figura de ’crime’ à prática da IVG, nas condições que a própria pergunta determina, e não de forma totalmente livre e sem freio como dizem os 'Nãos'.
Votar NÃO é dizer ao mesmo legislador para deixar tudo como está na lei, criminalizando a mulher.
Todas as novas nuances que querem dar os ‘Nãos’ são puras manobras diletantes e demagógicas, próprias de quem já se apercebeu ter esgotado os argumentos honestos que poderá ter para levar o eleitorado a dizer ‘Sim’ ao atestado de menoridade mental que querem passar à mulher, votando 'Não' à pergunta do referendo.
E não venham com gráficos tentando demonstrar que em outros países o número de abortos cresceu imenso depois da liberalização ou como lhe queiram chamar. Ele terá crescido na medida em que diminuiu o aborto clandestino. Então não é isso o que todos desejam, para já?
Sim, ao fim dos filhos indesejados.
Sim, ao fim da hipocrisia.
Sim, ao fim dos abortos em vão de escada.
Sim, ao direito da mulher a ser esclarecida sem medo, por profissionais da saúde, da psicologia e da sociologia.
Sim, à maioridade da mulher que não recorre à IVG de forma corriqueira e só porque lhe apetece.
Sim, à redução do número de mortes da mãe e do embrião resultantes da prática de abortos às mãos de curiosas.
Sim, à integração do país no grupo daqueles tantos que há muitos anos introduziram a prática de IVG assistida nos hospitais.
E não é uma médica-cientista portuguesa radicada em Londres, trazida à pressa pelos ‘Nãos’, afirmando de forma ridícula e vezes sem conta que “a comunidade científica, depois dos MEUS estudos sobre a dor no feto, aceitou que este sente dor”, que vai modificar o sentido estricto da pergunta.
Não se mistifique a questão! Não se confunda quem precisa de ser mais esclarecido! Ninguém defende o aborto. Todos pretendemos que ele diminua em valores absolutos mas, para lá se chegar, há que começar por mudar a lei que existe.
E todos, os "Sim" e os "Não", se devem unir e não cavar ódios que cheguei a vislumbrar nalguns olhos no programa de ontem.
Que todos votem em consciência, livremente!
- Jorge G
Publicação nº 282 - jorggEtiquetas: aborto, contras, IVG, pros, referendo