Convido-vos hoje a que venham comigo tomar um "café Moka"
ao «Marrare de Polimento», entre os números 54 e 64 da Rua Garrett,
na Lisboa do séc.XIX
"O Marrare de Polimento"
Lisboa era o Chiado, e o Chiado era o Marrare, e o Marrare dava o tom (...), escrevia Sousa Bastos, em “Lisboa Velha, Setenta Anos de Recordações”.
Inaugurado em 1820 e de certo modo sucessor do “Botequim das Parras”, o Marrare era o mais requintado dos quatro cafés que o napolitano António Marrare abrira em Lisboa.
Um luxo, a decoração de madeira polida, que logo lhe valeu a alcunha de Marrare de/o Polimento. Além da sala de bilhar, tinha ainda um pequeno pátio coberto por uma clarabóia envidraçada onde, no Verão, as senhoras podiam comer os melhores gelados da cidade.
Polido era também o atendimento: criados de libré serviam excelente café em cafeteiras de prata. Requintes para uma clientela ávida de mudança.
Servia -se o magnifico café genuíno «MOKA» e bebidas das melhores marcas.
O frontispício do café «MARRARE» tornou-se bem conhecido por uma gravura do tempo, onde se podia ler em duas tabuletas:
«VINHOS SUPERIORES ENGARRAFADOS. CAFÉ - LICORES E OUTROS OBJECTOS. BILHAR - »
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O Marrare tornara-se no local de reunião de todos os elegantes e todos os homens de Lisboa, como escreveram Bulhão Pato e Passos Manuel. Basta lembrarmo-nos de alguns dos indefectíveis: Almeida Garrett, Alexandre Herculano, Passos Manuel, José Estêvão. Fechado em 1866, o Marrare “renasceria” em “Os Maias” de Eça de Queirós. O seu futuro estava em ser ponto de reunião de todos os homens elegantes e de estrato social superior de Lisboa. Inaugurado no primeiro dia do ano de 1820 na R.ª das Portas de St.ª Catarina.
Atingiu o auge por volta de 1848, em que franquear as suas finas portas era por si só um estatuto.
O Marrare ditava o tom e a "lei". E parecia que assim o era de facto; numa altura em que, apesar de as damas já frequentarem este tipo de estabelecimentos (onde havia salas próprias para as senhoras), continuavam a ser personae non gratae, o café teve a ousadia de abrir uma excepção. Isto porque foi o primeiro estabelecimento a receber a primeira mulher frequentadora de bilhar: Ms Júlia Wilson. É certo que ela teve de jogar usando chapéu e sobrecasaca mas mesmo assim foi um feito que nenhuma outra dama tinha conseguido até à altura.
Um dos aspectos que contribuíram para o sucesso da casa foi o famoso Bife à Marrare, muito apreciado entre a clientela.
Bife à Marrare
***
Ingredientes: Por pessoa
1 bife alto do pojadouro (200 g) ;
80 g. de manteiga ou margarina ;
3 colheres de sopa de natas ;
sal ;
pimenta preta em grão;
Confecção:
Numa frigideira de ferro ou de aço bem forte, derrete-se em lume vivo metade da manteiga ou da margarina.
Quando estiver bem quente, introduz-se o bife e deixa-se alourar de um dos lados.
Vira-se o bife sem o picar e aloura-se do outro lado.
Esta operação, que deve ser relativamente rápida, tem por fim evitar que o suco da carne saia.
Tempera-se com sal grosso e pimenta moída na altura.
Escorre-se da frigideira a gordura em que o bife fritou (conservando o bife) e junta-se a restante manteiga.
Reduz-se a chama e deixa-se fritar o bife durante uns minutos, agitando a frigideira.
Adicionam-se as natas e deixa-se engrossar o molho, continuando a agitar a frigideira.
Coloca-se o bife num prato aquecido e rega-se com o molho.
Serve-se acompanhado com batatas fritas em palitos, dentro de um prato coberto com um guardanapo. - (Receita colhida em www.gastronomias.com )
O Marrare de Polimento fechou portas no ano de 1866.
Mais de 50 anos depois, abriria a Brasileira do Chiado que ainda hoje existe e na direcção da qual parece que Fernando Pessoa se dirige ao atravessar a Rua Garrett.
Publicação nº 703 de "O SINO DA ALDEIA "- Jorge P.G.