quinta-feira, 4 de setembro de 2008
SALVADOR ALLENDE e o MÊS DE SETEMBRO
Allende foi eleito em 4 de Setembro de 1970 para a Presidência da República, com 36,3% dos votos expressos, contra dois candidatos da direita, Jorge Alessandri(35%) e Radomiro Tomic (27,8%). Uma maioria curta validada pelo Parlamento graças ao apoio da democracia-cristã. E assim, pela primeira vez num país da América Latina, um marxista chegou ao poder através das urnas.
A presidência era frágil, naturalmente. Médico franco-mação saído da burguesia endinheirada, Allende fez-se apoiar numa coligação heterogénea, que ia do centro reformista atè à esquerda revolucionária, com trotskistas e maoístas, e com comunistas à mistura como era óbvio. O Partido Socialista de Allende era mesmo mais à esquerda que o próprio PC e aspirava à rotura com o capitalismo.
A nacionalização das minas de cobre e das principais empresas do país; a reforma agrária; o congelamento dos preços; os aumentos de salários;... para uns moderados e para outros demasiado radicais, nunca geraram a unanimidade nas suas fileiras de apoio. Em breve o Chile foi sacudido por uma violenta agitação da extrema-esquerda revolucionária (o MIR) que, e contra o aviso dos prórios comunistas(!), expropriou os proprietários de terras mesmo fora da legalidade
Com a subida dos preços e o afundamento da produção de bens alimentares, o país começou então a conhecer greves repetidas, como a dos camionistas, emanifestações de rua como a das donas-de-casa.
Simultaneamente, o Presidente tinha de fazer frente a uma oposição maioritária de direita no Parlamento. Esta era apoiada, "por baixo da mesa", por agentes secretos da CIA e financiada pelas multinacionais implantadas no país, entre as quais a gigante TELECOM ITT. Nos Estados Unidos, Nixon e o seu secretário de estado Kissinger, envolvidos ainda por cima no atoleiro vietnamita, receavam a reedição de um golpe de estado pro-soviético à maneira de Fidel Castro em Cuba, dez anos antes.
Então, a extrema-direita cometeu um atentado contra o comandante-em-chefe do exército, o general René Schneider, um fiel apoiante de Allende. O presidente apelou ao auxílio dos militares para se defender das ameaças que o perseguiam por todos os lados e, desconfiando da força aérea e da marinha, de tradições aristocráticas, apoiou-se nas forças de terra e no recrutamento mais popular. Nomeou, assim, um novo comandante, Carlos Prat, que por sua conta chamou para Chefe do Estado-Maior um general anódino de 58 anos, nada suspeito de activismos, proveniente de um meio popular e franco-mação como Allende, um tal Augusto Pinochet.
Em Novembro de 1972, Calos Prats tornou-se Chefe do Governo e Ministro do Interior, enquanto Pinochet o substituía no Comando do Exército, fazendo ambos face a uma rebelião de oficiais em Junho do ano seguinte.
A situação económica piorava e o Parlamento decidiu privar Allende de todoss os meios de acção, tentando ainda recusá-lo no lugar. O presidente tentou então o recurso a um referendo, mas o exército insurge-se e em 23 de Agosto de 1973, Prats deixou o comando do exército de terra para Pinochet. Duas semanas depois, em 9 de Setembro, os outros ramos das Forças Armadas decidiram pôr fim pela força à experiência socialista e persuadem o general Pinochet a juntar-se-lhes numa Junta Militar criada. E assim, na manhã de 11 de Setembro de 1973, unidades da Marinha atacaram o porto de Valparaiso e logo depois, em Santiago, soldados invadiram o palácio presidencial de La Moneda. Uma das últimas fotos de Allende, observando o ataque aéreo.
Cerca do meio-dia, a aviação bombardeou La Moneda, permitindo a invasão do palácio pelos soldados de terra. Allende proferiu então uma última alocução pela rádio. Segundo uns, para evitar cair nas mãos dos soldados, suicidou-se com uma rajada de metralhadora ou com a pistola que Fidel lhe dera. Para outros, como a própria sobrinha Isabel Allende, foi simplesmente assassinado. Tinha 65 anos.
O governo da Unidade Popular deixara de existir e com ele um sonho de muita gente. Para o Chile, foi o fim de uma prática democrática de dezenas de anos que lhe valera o elogioso epíteto de "Prússia da América do Sul" ou ainda de "Suiça da América do Sul".
Nos dias que se seguiram, dezenas de milhar de pessoas suspeitas de simpatias marxistas foram presas e concentradas no sinistro Estádio nacional de Santiago, onde os fuzilamentos sumários se multiplicaram. Víctor Jara foi um deles. Outros, desapareceram tragicamente nas prisões militares, e muitos foram torturados antes da sua execução efectuada das mais diversas formas violentas e sádicas, como serem lançados de aviões sobre o oceano...
Só 25 anos mais tarde Pinochet viria a ser indiciado por crimes contra a Humanidade.
Manteve-se no poder até 1990, tendo criado uma polícia política - a DINA (Dirección de Inteligencia Nacional), que viria a fazer desaparecer os seus opositores, tanto no Chile como fora do território.
O general Prats foi morto em Buenos Aires juntamente com a esposa, num atentado à sua viatura armadilhada.
Pinochet, entretanto, para recolocar a economia a seus pés, chamou a si jovens economistas diplomados pela Universidade de Chigago, os «Chicago Boys», que aplicaram à letra as receitas liberais do economista americano Milton Friedman.
Em 1988, finalmente, o "supremo chefe da Nação" realizaou um referendo. Com a URSS em agonia, desta vez o Chile não era de nenhuma utilidade para Washington. 54% dos votantes foram contra a prorrogação do mandato do velho Pinochet.
Em 11 de Março de 1990, Pinochet deixou a presidência, embora tendo conservado por mais oito anos(!) o comando do exército!
Detido em Outubro de 1998 em Londres, após uma perseguição movida por um juíz espanhol, Baltazar Garzon, que o pronunciara por crime contra a Humanidade, Pinochet regressou ao Chile 503 dias após a detenção na capital inglesa.
Morreu riquíssimo, em 10 de Dezembro de 2006, sem nunca ter verdadeiramente expiado os seus crimes.
Publicação nº 611 - O Sino da Aldeia - Jorge P.G.
Sino tocado em
setembro 04, 2008 -
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