terça-feira, 8 de agosto de 2006
O meu paraíso alentejano
Às 6:30, primeiros dias de Agosto, o Rei acorda ali olhando de frente para os quartos
Na Quinta do Barrieiro entrei hóspede, vivi em casa, parti amigo.
Para quem saia de Castelo de Vide ou de Portalegre, são só mais uns poucos Km até à estrada para um lugarejo premonitoriamente chamado Reveladas. De facto, ultrapassado o portão principal da Quinta, são reveladas ao viajante as primeiras sombras das árvores que nos refrescarão durante a estadia. Chegámos à Quinta do Barrieiro, onde somos saudados pelo olhar sonolento do Bernardo deitado à sombra do muro da casa principal, naquela letargia diurna de quem não dorme depois que o sol se deita, pois que cão-de-guarda é um mister que o Bernardo dignifica desde que se reconhece como tal há mais de uma dezena de anos. Mas são só uns dois minutos até que surja o sorriso luminoso do José Manuel a receber-nos, afável e prazenteiro. Já assim fora da primeira vez. Guardado pela sombra das árvores, o carro descansa do braseiro à distância de uns passos do quarto reservado. Curiosamente designadas de acordo com as cores da decoração, as pequenas habitações têm tudo o necessário para quem procura o descanso e a tranquilidade de uma quinta no campo. São limpas, confortáveis, frescas e convidam-nos a um apetecido repouso. Sem luxo ou espavento, reflectem o bom-gosto dos proprietários na sua decoração sóbria, confortável, harmoniosa. Depois, pelo cair da tarde, quem lá chega pela primeira vez não resiste ao curioso descobrir do espaço circundante. E então... o paraíso revela-se. São as rãs e as relas da charca, a subida ligeira até à piscina com um pequeno espaço mesmo ao lado para os mais pequenos, as amoras maduras por colher ou que escaparam à panela do doce da Maria , as esculturas desta espalhadas numa ordenada desordem por toda a parte, pedra, ferro e bronze a céu aberto, figuras cheias de movimento em perfeito contraste com a quietude que as envolve e lhes ressalta as formas onduladas e sonhadoras. É a arte da Maria Leal da Costa, que não se esconde em exposições, antes se abre aos céus no ambiente em que a artista as criou. Depois, nunca faltam: a companhia da Jacqueline, uma canita doce e educada que não entra no quarto sem convite, mais a de mãe e filha gatas de pelagem branca e preta, pequeninas e meigas, mimadas e interesseiras como apenas os gatos sabem ser. Chegada a noite, o silêncio é ainda mais absoluto, entrecortado pelo canto persistente e manso das cigarras e o coaxar que vem da charca, numa conversa de comadres que as rãs põem em dia. A lua espreita por entre a folhagem, Catalina acordada quando Lorenzo se deita, como dizem os amigos de Espanha que está logo ali, por detrás daqueles montes além, que se acendem de longe a longe por algum carro que lá passa sem se ouvir. No céu, contam-se as estrelas, são tantas e mais uma quando um avião se lhes junta e nos recorda que estamos em terra. À porta do quarto, sentados à luz do candeeiro da parede que ofusca e aquieta os insectos campestres, podemos ouvir os sons do silêncio, fechando os olhos e sentindo...sentindo só. Ou então ouvir Chopin, Mozart e a sua Eine kleine Nacht Musik, ou Beethoven - Für Elise, optar pelas medievais trovas de Angelo Branduardi cantando S.Francesco d'Assisi e a sua pregação aos pássaros nos pauis de Venezia, e sonhar...embalados...sonhar...e adormecer até que o canto das aves madrugadoras, bailando de árvore em árvore, nos despertem para a vida que se renova mais forte em cada manhã. Então, um bonito saco contendo pão e bolo, aguarda que o retiremos do gancho colocado à porta e lhes juntemos o mel, o queijinho regional, presunto de montado irmão do famoso de Parma, o café,... que a D.Antónia renova dia-a-dia. Passeio matinal enquanto o sol não queima, um mergulho na piscina, umas brincadeiras com a bicharada, e segue-se um passeio por terras vizinhas. Castelo-de-Vide com as belíssimas ruelas da Judiaria, Marvão que se transforma numa vila-modelo sem antenas nos telhados de casas brancas, uma volta em redor da Serra de S.Mamede onde a paisagem é uma feliz mistura de Alentejo e Beira-Baixa, o descobrir das antas e de ruinas romanas que a região oferece,... Ou então, fazer 12,8 Km da Quinta ao posto de abastecimento mais próximo, com o carburante 25/26/27 cêntimos mais barato, e andar mais 10 Km até à progressiva vila de Valência de Alcântara ou mais cerca de 100 até à monumental Cáceres com um centro histórico deslumbrante, imperdível. No regresso, por boa estrada sem tráfego, o descanso espera-nos na Quinta. É o retorno ao meu paraíso alentejano. Inspiro profundamente o ar puro da serra e ponho-me de novo a sonhar.
A Canita, para mim Jacqueline, junto da piscina, ao nascer do dia 5/Ag/06
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Fotos e texto de Jorge P.G.
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Sino tocado em
agosto 08, 2006 -
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