Algo, indiscutível, decorreu das eleições italianas: o rotundo "Não" ao Sr. Monti, o tecnocrata indicado pelos alemães para levar por diante uma política de austeridade que, como em toda a Europa que a segue, só tem dado maus resultados.
Dos cerca de 50% de italianos que foram às urnas verificou-se de resto o que já se previa, mais voto menos voto, para além de uma clara recusa de Monti, 1/4 da população votou no candidato Grillo, num evidente protesto contra a ineficácia dos partidos tradicionais, mais do que numa crença que seja Grillo a resolver os problemas do país. 1/4 do povo votante não se revê nos partidos nem nas coligações, e isto sem somarmos grande parte que se absteve.
Fala-se, agora, de uma Itália politicamente ingovernável porque as alianças vencedoras - a de Bersani e a de Berlusconi - não se entendem, naturalmente, para a formação de um governo estável. Resta ao Sr. Bersani o recurso a apoios pontuais de Grillo.
Ora, desde o tempo da "Guerra Fria" que a Itália sempre tem sido governada por precárias maiorias com a complacência e/ou a aquiescência do Vaticano e da Mafia. A perseguição aos comunistas e o abate de polícias e de juízes opositores do regime vigente sempre fez parte do quotidiano, sem grandes manifestações do povo.
A Itália é um país especial, sempre arranjou soluções para formar governos, ainda que estes durem pouco tempo.
A grande lição de agora, a tomar pelos portugueses, foi o surgimento do Movimento liderado por Grillo e a forte adesão que conseguiu nas urnas.
Assim, a democracia que se fundeia na existência de partidos políticos "profissionais" foi recusada por imensa gente, demasiada gente.
Lá, como cá, uma muito substancial fatia da população anseia por outro tipo de práticas democráticas, menos centralizadas na partidocracia e mais virada para uma democracia mais directa, na qual os representantes do povo sejam menos dependentes da cega disciplina que lhes é imposta pelos partidos, isto é, representantes menos funcionários atentos e obrigados ao partido e mais legítimos porta-vozes dos que os elegem.
Será o exemplo italiano o princípio do fim dos partidos como hoje operam?
Portugal e os chefes partidários do país devem estar bem atentos ao ocorrido em Itália, pois o descontentamento, a revolta, a raiva dos portugueses cresce dia a dia.
- Crónica de Jorge MP Guedes