Ponte da Barca, a velha Terra da Nóbrega, com os seus cinco Coutos e uma Honra, terra de muitos caminhos, pois ali afluíam os peregrinos que, de Braga se deslocavam até Santiago de Compostela e da Ribeira Lima a Orense, pelo Lindoso.
Mas não era só por ser "Caminhos de Santiago" que as Terras da Nóbrega justificavam a sua influência nas bacias dos rios Lima e Homem e a que as suas 31 freguesias fizeram jus.
A comprovar o que acabamos de afirmar, está o facto de ter sido sede da Corte Portuguesa durante cerca de um mês, no ano de 1386.
Durante o mês de Outubro desse ano, El-Rei D. João I estacionou em Ponte da Barca, com numerosa comitiva militar e vários funcionários de chancelaria, entre os quais Gonçalo Peres, seu vassalo e vedor de sua fazenda e os seus notários régios, Álvaro Peres, Gonçalo Caldeira, Lançarote e Vasco Vicente.
O motivo da sua estada era político. Pelo Tratado de Windsor, celebrado na corte Inglesa, entre D. João I e Ricardo II, a Marinha de Portugal apoiou a vinda do Duque de Lencastre com a família e o seu exército e o tesouro, para a Península Ibérica.
O Duque desembarcou na Corunha e fixa corte em Santiago de Compostela, de que Froissart escreve com pormenor todo o aparato e luxo. Motivos: a conquista do trono de Castela, direitos de sua esposa Constança, filha de Pedro, o Cruel, de Castela e Leão, contra o bastardo Henrique de Trastâmara, usurpador do Reino; o casamento da filha Filipa com o Mestre de Avis.
D. João I manda recado a D. Nuno Álvares Pereira da marcação do encontro na Ponte do Mouro, em Monção.
O Condestabre, quoando vio o recado dell Rey como o Duque era em Gualiza, e que porquoamto cupria de se ver com elle lhe mamdava que se fizese prestes e se fose peraquell lugar huu aviam de ser as falas, trabalhou loguo de se coreger. E com çertos cavaleiros e escudeiros, bem coregidos e emcavalguados partio pera alla. E achou ell Rey na Pomte da Barqua, que de sua vimda foy asaz ledo e o reçebeo muy bem (Fernão Lopes – Crónica de D. João I).
D. João I sai de Ponte da Barca em 14 de Outubro de 1386. Seguem a estrada medieval, em direcção a Riba Minho. Esquerda do Rio Vez, passando por Ázere, São Cosme e São Damião. Atravessam o Vez em Vilela; depois Aboim das Choças, Portela do Vez, Portela do Extremo, Rio Bom, Chim, Trute, Moreira, até Monção. Havia, igualmente, um outro caminho, que passava na Ponte de Cabreiro, em direcção a Sístelo, Portela do Alvito, Merufe, Barbeita, Ponte do Mouro, fazendo a sua ligação à margem espanhola, por barca, até às Neves.
Não sabemos qual destes Caminhos D. Manuel I percorreu no seu regresso de Santiago, onde ofereceu ao Apóstolo uma lâmpada de 5 fogos, que deveria ficar acesa permanentemente depois do seu regresso (1502). A tradição diz que o "Venturoso" aqui recebeu aposentadoria de Isabel Gonçalves da Costa, filha de Maria Lopes da Costa, mulher nobre, que nos últimos anos do Séc. XV, aqui fez construir uma casa sobradada e onde vivia rodeada de numerosa prole.
Foy a sua casa a primeira de sobrado, que alli houve, e em que vivia sua filha Izabel Gonçalves da Costa, quando El rey Dom Manoel veyo a Santiago de Galiza e nella pousou, fazendo-lhe muitas mercês a seus filhos; e esta he a razão porque os principaes desta Villa são todos Costas por sangue e usão deste apellido.
Aqui deixo estes três motivos excelentes para uma visita ao concelho de Ponte da Barca: ao Casco Histórico da Vila; à Ermida, no coração da Serra Amarela; pelos Caminhos de Santiago, na senda de dois Reis, D. João I e, posteriormente, D. Manuel, que aqui receberam aposentadoria.
As Nossas Receitas
A Posta BarrosãVoltemos a um ex-libris da região! À gastronomia! Comecemos pela Serra Amarela, referência emblemática da raça barrosã, cuja carne é um autêntico manjar dos reis, dádiva suprema da serra e da natureza! As boas viandas barrosãs – a costela de vitela com arroz de feijão; a vitela assada no forno com batatas a murro (com pele); os grelhados; o naco de carne de vitela grelhado na brasa, com molho avinagrado para condimentar as batatas cozidas. Autêntico "manjar de reis", a Posta Barrosã vai ser privilégio para quem visitar este fim de semana, o concelho de Ponte da Barca, com onze restaurantes disponíveis com aquele precioso prato tradicional. Mas vai haver também e pela primeira vez vinhos oficiais do fim-de-semana gastronómico que os restaurantes de Ponte da Barca vão primar em apresentar da responsabilidade da Adega Cooperativa de Ponte da Barca: branco e tinto; branco meio seco; branco loureiro; Terras da Nóbrega branco e tinto; e a última grande aposta da adega: tinto vinhão proveniente de uma selecção rigorosa proveniente da casta recomendada vinhão, a sua cor intensa e a envolvência do aroma revelando a tipicidade deste vinho que o consagra e distingue entre os melhores. No fim, a aguardente velha da adega: um aguardente vínica obtida a partir da destilação de vinho verde das castas regionais após um longo processo de envelhecimento em cascos de carvalho.
Posta Barrosã com Arroz Malandro
(Receita cedida por António Luís Oliveira – Restaurante "O Moínho" – Ponte da Barca)
A posta barrosã tem que ser da rabada da vitela e deve ter uma espessura de 3 a 4 cm.
É temperada na hora de grelhar, só com sal. Grelha-se na brasa de carvão forte, até ganhar cor. Depois de grelhada é passada pelo molho constituído por azeite, vinho branco, vinagre, pimenta , alho e alecrim. Antes de servir é aquecida ou fervida.
Arroz malandro
Faz-se o refogado com cebola picadinha e azeite, salsa, louro e alecrim. A parte coze o feijão, em lume brando. Depois de cozido, acrescente-o ao refogado. Junte-lhe a água da cozedura. Deite o arroz e as hortaliças ( brócolos, repolho ou couve galega). Deixe cozer cerca de 15 minutos.
Rabanadas de Mel
Fatias de pão trigo já endurecido com alguma espessura (a gosto), 1 litro de leite, 1 litro de água, 2 paus de canela, manteiga, limão, 3 colheres de mel e açúcar. Numa panela ferve-se o leite, a água e os restantes ingredientes. As fatias são demolhadas nesta calda bem quente. Escorrem-se e passam-se por ovos batidos. Frita-se em azeite e depois de bem escorridas, servem-se polvilhadas com açúcar e canela. Ao lado alguns favos para abebedar com mel as fofas rabanadas.
Francisco Sampaio*
* Ilustre e prestigiado gastrónomo, Juiz da Confraria dos Gastrónomos do Minho, Presidente da Região de Turismo do Alto Minho, docente e investigador, excelente comunicador, altamente considerado por todos os membros das mais diversas Confrarias.
in "Roteiro Gastronómico de Portugal"
Jorge G. 04.10.2006